terça-feira, 23 de agosto de 2011

QUIXÓ

Um espojeiro no fim do caminho.
Uma pedra, um quatro com três paus.
Cambão, tabuleta, vareta.
Isca na armadilha da morte.
O crepúsculo como cúmplice.
A fome da noite janta a vida.
O degustar, o quatro desfeito.
A pedra vira assassino e sepultura.
A comida traz a morte.
Na madrugada o bisaco o transporta.
Banho de cinza ou de água quente.
Cabeça, pés e mãos decepados.
O sol, o sal, a exposição.
Sai o cheiro, fica o gosto.
A comida traz a vida.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

FILICÍDIO

Lembro-me ainda de quando fiquei grávido de você, foi divino.

Você cresceu em mim por três anos, até que nasceu, vivo, forte e contagiante, eu é que me tornei criança.

Fascinou e brilhou como nunca um astro havia.

Encheu-me a vida de vida.

Cresceu tanto que só pude contemplá-lo e reverenciá-lo.

Um ser melhor e maior do que seu criador.

Foi meu tudo, minha maior proximidade da perfeição.

O alimentei com o calor do meu sangue e o protegi nas entranhas de minha carne.

Meu sonhar o guiou pelo mundo e meu coração o fez sentir.

Contemplei sua primeira morte incrédulo, minha descrença o fez renascer, e pude viver melhor em seus braços.

Sorri e chorei contigo e por ti, e o desejei que fosse eterno.

A vida me viu morrendo por você, e comigo também morreste, ao morrer juntos eu renasci, a vida também te trouxe, só que doentio.

Fraco, mesmo assim, indomável.

Pude me fortalecer com sua fraqueza.

Ergui-me nos degraus de sua decadência.

Até que engravidei e pude parir seus irmãos, a você idênticos, mas não primogênitos.

Quase todos morreram recém-nascidos e não renasceram, e você os cumpliciou, os ajudou a nascer e a morrer.

O tempo foi seu aliado.

E o tempo que me crucificou em teus braços, ensinou-me a arte do filicídio.

Agora o sabre da razão, empunhado pela verdade, dará fim à existência dos teus nasceres e morreres.

O sepultará na cova do esquecimento, na qual, a vida brotará como flores lindas e perfumadas.

Um lindo Jardim encantando borboletas e beija-flores.